quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

ENTREVISTA COM ROBERTO FREJAT, VOCALISTA DO BARÃO VERMELHO

28 de abril de 2006. O Barão Vermelho faria – como de fato fez – um show em Marília como evento de boas-vindas aos calouros da Universidade de Marília dadas pelo DCE (Diretório Central de Estudantes-Unimar), em seu projeto intitulado Baile do Bixo. E o que eu tenho a ver com isso? O Diretório possuía um veículo de comunicação mensal, intitulado Gregos & Troianos (G&T), e eu, além de outros estudantes de Jornalismo, estagiava nesse informativo.

Na tarde daquela sexta-feira, horas antes do show, a banda havia acabado de chegar à cidade, hospedando-se no Max Plaza Hotel, na Rua Maranhão, próximo à Galeria Atenas (perdoe-me pelos merchans). Meu chefe, Luccas (não digitei errado, é com dois “C’s”), intimou Vicão e eu a irmos até lá, em busca de uma entrevista e fotos. Detalhe: Luccas, presidente do DCE, disse: “está tudo combinado com a banda, os integrantes vão receber vocês para uma conversa”. É óbvio que era mentira.

O fato é que fomos, e uma curta entrevista com Frejat foi possível. As cinco perguntas que eu havia feito às pressas colheram respostas gravadas num celular LG (outro merchan), do próprio Vico (Vico ou Vicão é o Vinícius, camarada de estágio e amigo da faculdade). A única foto registrada foi perdida. Dani, companheira nossa de DCE, apagou a imagem, muito provavelmente por ter ficado puta, pois queria ela ter estado lá (brincadeirinha, Dani).

Abaixo, um pedaço bem pequeno de um dia marcante.


Em meio à possibilidade de não realizar esta entrevista no camarim momentos antes do show, saímos (Vinícius e eu) às ruas da cidade ansiosos e apreensivos. Ansiosos porque entrevistaríamos um dos grandes ícones do rock nacional. Apreensivos, vendo que havia uma chance de não conseguirmos um depoimento sequer.

Roberto Frejat concedia entrevista coletiva, naquele instante, no hotel em que estava hospedado. Quando chegamos, não havia mais nada. Mas havia alguém: um dos seguranças da banda.

Simpático e prestativo, ouviu-nos com atenção e entendeu a nossa necessidade de disponibilizar no informativo da entidade um depoimento da banda por meio do seu vocalista, que tocaria mais tarde em Marília. Dez minutos depois, Frejat chegou ao saguão do hotel, onde o segurança passou a ele a nossa intenção. O “Rei dos Blues” nos recebeu na hora e falou, com exclusividade, ao G&T.

O início, passagens da história, Cazuza e o novo trabalho foram assuntos que Frejat se prontificou a responder.

Com a palavra, para você, leitor do informativo, Roberto Frejat, vocalista do Barão Vermelho.

[G&T] Toda banda, ao se formar, decide se reunir com algum intuito, seja ele financeiro ou ideológico. No caso de vocês, com qual propósito o grupo Barão Vermelho se juntou?
[FREJAT] Na verdade, o grupo começou com o Guto e o Maurício. Eles já estavam querendo fazer uma banda de rock. Isso na época que a gente começou, em 1981, não tinha o menor potencial comercial. A ideia era fazer uma coisa que a gente gostasse, e eles conseguiram uma data para fazer um show de uma banda, e essa data foi o primeiro objetivo para a banda ser formada.

[G&T] Quando participaram do Rock in Rio 85, vocês gravaram o primeiro disco ao vivo da banda. Por esse grandioso evento ter acontecido apenas três vezes, você acha que o festival não engrenou?
[FREJAT] Não. Na verdade, eu acho o Rock in Rio um grande sucesso como marca, é o festival conhecido no mundo inteiro, que é difícil de acontecer quando um evento desse tem destaque no Brasil. Um evento desse tamanho dificilmente é comportado anualmente: primeiro pela quantidade de artistas que é preciso colocar; depois, se ficar anual, acaba exigindo uma certa rotatividade de artistas, e nem todos têm disponibilidade para vir ao Brasil. O Rock in Rio abriu a porta para os artistas internacionais virem ao país. A partir do festival, o Brasil ficou confiável para se fazerem shows.


[G&T] Neste novo trabalho, o Ao Vivo MTV, vocês inseriram o Cazuza em uma das músicas [Codinome Beija-Flor]. De quem foi a ideia? Por quê?
[FREJAT] A ideia veio do Guto e do Maurício, porque todos esses shows ao vivo da MTV têm convidados. Nenhuma pessoa como convidada especial seria mais coerente com o trabalho do que o Cazuza. Fazer com que ele estivesse ali com a gente seria sensacional. O Guto sugeriu Codinome Beija-Flor, que é uma música belíssima. A partir disso, só faltou resolver os problemas técnicos para que acontecesse. É difícil fazer esse “encontro”, mas a gente tem feito e fica um momento muito emocionante do espetáculo.

[G&T] Por que a música O tempo não para foi escolhida para o repertório do CD e DVD, já que é de autoria do Cazuza e do Arnaldo Brandão, e Ideologia, música da parceria Frejat/Cazuza, não foi gravada?
[FREJAT] A gente achou que O tempo não para era uma letra muito atual, uma música que cabia uma interpretação do Barão. Talvez um discurso muito pessoal do Cazuza não funcionasse. E eu tinha em mente que Ideologia, mesmo sendo escrita por mim também, possuía esse discurso próprio do Cazuza.

[G&T] Como vem sendo a receptividade do público com relação a este novo trabalho de vocês, com o CD duplo e o primeiro DVD?

[FREJAT] Tudo está correndo da melhor maneira possível, acima daquilo que esperávamos. E o melhor de tudo isso é que a gente percebe que todas as faixas etárias acompanham o nosso trabalho. Ainda hoje nós vemos, em todos os lugares em que fazemos shows, pessoas mais novas do que a gente, da nossa idade e até mais velhas assistindo e cantando as nossas músicas. Por causa disso, este trabalho atual está sendo maravilhoso.

domingo, 15 de dezembro de 2013

SE LEI E JUSTIÇA ESTÃO EM LADOS OPOSTOS, SEJAMOS JUSTOS

O STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) julgará amanhã (16/12) se a Portuguesa será punida pela escalação do jogador Héverton, atleta impossibilitado de atuar por ter sido suspenso pelo mesmo tribunal. O atacante havia cumprido um jogo de gancho e precisaria ficar ausente de mais um, no caso, o embate contra o Grêmio, na última rodada do Campeonato Brasileiro.

A rigor da lei, a Lusa deveria perder o ponto que conquistou no empate (0x0) contra o time gaúcho, além de mais três pontos por escalar irregularmente determinado jogador. Na leitura fria da lei, chega-se à conclusão de que o clube paulista deve perder os quatro pontos, passando a somar uma pontuação menor que a do Fluminense (de 48 passaria a 44, dois a menos que o Flu), time que ficou em 17º lugar, ou seja, o primeiro dos quatro últimos. Sendo assim, o clube das Laranjeiras permaneceria na divisão de elite do futebol nacional e a Portuguesa disputaria a Série B em 2014.

No entanto, a reflexão aqui traz como elemento principal a ideia de justiça. Em tese, uma lei é elaborada e aplicada com vistas a resguardar o exercício da justiça, o que significa afirmar que justiça e legislação caminham de mãos dadas, isso quando não são a mesma coisa. A execução da lei é, então, o desenrolar automático daquilo que entendemos por justiça.


O fato é que, neste caso, o cumprimento da lei conduz a situação a um desfecho oposto ao que ela, a lei, deveria conceber. Isto é, leva o caso à consumação de uma injustiça. E por quê? Primeiro, a Lusa não cometeu o erro por dolo, ainda que o crime culposo seja passível de punição. Segundo, o jogador irregular atuou durante os últimos 14 minutos de uma partida que não valia rigorosamente nada e que, como já dito, terminou em 0x0. A Lusa estava livre do rebaixamento e o Grêmio, classificado para a Libertadores do próximo ano. Terceiro, o tricolor carioca não caiu para a segunda divisão devido à escalação ilegal do jogador da Portuguesa. E é justamente pelos três motivos – especialmente pelos dois últimos – que seria descabido punir o time paulista e, consequentemente, livrar o Flu.

O que fazer, pois, se o regulamento prevê uma atitude por parte dos juízes desportivos e o cumprimento da justiça pede outra ação? É evidente que não cumprir a lei abriria um precedente, no qual outros clubes futuramente poderiam se apoiar – aí, sim, de má fé – para tirar uma vantagem qualquer.

A alternativa mais cabível seria extrair os quatro pontos da Lusa no início do campeonato seguinte. Dessa forma, o clube iniciaria o Brasileirão-2014 com -4 pontos, não favorecendo, agora, diretamente o Fluminense, já que este – e nem qualquer outro time – não tem direito algum de se beneficiar do erro alheio. Como dissemos, o tricolor do Rio não foi rebaixado pela escalação irregular do atleta de outro time, e sim pela própria incompetência administrativa e técnica. Em suma, a Portuguesa seria punida, como manda a lei, mas sem beneficiar de forma direta clube nenhum. Neste caso, cumpre-se a lei e preserva-se a justiça.


Para o ano que vem, com o Fluminense atuando na Série B e a Portuguesa devidamente punida, como manda a regra, é importante pensar na reformulação do regulamento, já que ficou provado que este não está em conformidade com o que se entende por justiça.

A mudança mais emergencial deve prever a punição com a perda dos pontos do jogo – e nada mais –, mexendo minimamente na classificação. Outro método a ser implantado é aprimorar a comunicação entre tribunal e clubes, que, diga-se, funciona de maneira amadora. Hoje, o tribunal passa a decisão jurídica ao advogado ou representante do clube e este repassa à direção. O ideal é que essa comunicação ocorra de modo direto, com base em notificação. Por incrível e mais elementar que possa parecer, não é assim que a CBF e o STJD trabalham, dando a dimensão da precariedade a que está entregue o nosso futebol.

Embora tenha havido ilegalidade, a Lusa não foi imoral. Que a moral do campo prevaleça e vença, pois o que está em jogo agora não é a necessidade do Fluminense jogar a segunda divisão por já ter se livrado de outro rebaixamento, em 2000. O elemento-chave aqui é não prejudicar deliberadamente um clube menor, traço histórico do futebol brasileiro. Exige-se apenas e tão somente justiça.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2013

“ELE TERIA DITO” OU “ELE DISSE”: o bom jornalismo não relativiza

Eis a prerrogativa elementar da imprensa: informar o público de modo responsável acerca dos assuntos que lhe são relevantes. Se reduzíssemos a máxima jornalística a uma palavra, encontraríamos o termo informar. Porém, com as novas tecnologias e a concorrência cada vez mais acirrada, começa a despontar no jornalismo da grande mídia uma prática que vai de encontro ao seu papel elementar: tornou-se habitual utilizar o verbo no condicional para se referir a algum fato que não foi devidamente apurado e que, portanto, não deveria ser publicado.

E por que essa mudança de vocação acontece? Ocorre que a disputa por quem publica primeiro a notícia, o que o jargão habituou-se a chamar de furo, apressou a apuração da informação, isso quando não boicota tal procedimento, fundamental na práxis jornalística. É sabido que a ordem da livre-iniciativa, sob a permissão do capitalismo, tomou conta da economia. Como a grande mídia funciona tal qual uma empresa, informação e lucro passaram a ser indissociáveis. É aí que entram as conveniências, quando um veículo noticia aquilo que apetece a si e a seus parceiros, e o jornalismo, é obvio, perde.

Aliado a isso vêm as novas tecnologias, encabeçadas pela internet e suas ferramentas mais usuais. E é inevitável analisar a imprensa online sem entender que essa interface influencia todas as demais, especialmente a TV. Porque é natural um canal televisivo se incomodar com a rapidez com que a informação escoa na internet, e deixar-se dominar pela pressa, que o senso comum, inteligentemente, afirmou ser inimiga da perfeição. Não se pretende aqui demonizar a evolução tecnológica, mas prudência no seu uso pode regrar o vai-vem informativo.


É nessa necessidade – mais preocupada com o lucro do que com a informação, diga-se – que se encontra o problema. Não é raro ler ou ouvir frases hipotéticas, cujo verbo se apresenta no condicional: “fulano teria dito”, “sicrano teria feito”. Preza o bom jornalismo que se a informação não foi devidamente apurada, a ponto do verbo não conseguir cravar a ação, ela não vira notícia. É algo tão elementar que se aprende nos primeiros meses de faculdade ou de redação.

O dilema, que o mercado se incumbiu de excluir, é esse: “espero para ter certeza e corro o risco de ser superado pela concorrência ou, mesmo na dúvida, publico, pois se eu não fizer, outro o fará, e depois verifico se o fato confere ou não?”. A dúvida inexiste, pois a premência de tudo faz prevalecer, especialmente na grande mídia online – com respingos na TV –, a segunda opção. E vemos, então, um festival de leads com verbos portando o sufixo “ia”.
Trecho do texto, publicado em 19 de abril de 2012 na seção Poder, extraído do portal www.folha.uol.com.br, cujo título simboliza o assunto abordado neste post.

Entre isso e a não informação a distância é nula. Em caso de incertezas, é simples: não há o que publicar. Mas como a disputa empresarial é intensa e as ferramentas de disponibilização de conteúdo agilizam afirmações e desmentidos, o mote do jornalismo deixa de ser a publicação da verdade factual e se torna apenas a publicação. A verificação da fidedignidade era condição precípua para a veiculação da notícia. Sob a nova tendência, a confirmação fica para depois.

O jornalismo, enquanto campo de atuação junto à sociedade e mediação entre esta e os acontecimentos, construiu a sua credibilidade não pela quantidade de fatos noticiados, mas sim pela garantia de portar consigo a verdade, o elemento confiável que imprime fidelidade entre público e meio de comunicação. O que seria dos amontoados de manchetes sem uma boa história, rigorosa como deve ser, capaz de dar sentido aos destaques e fazendo a capa valer a pena. 

sábado, 7 de dezembro de 2013

1918-2013: a história se escreveu

É difícil não ser piegas ao falar de Mandela. Tentarei não ser. Ao mesmo tempo, dane-se o patrulhamento aos adjetivos demasiadamente afetuosos. Se não os descarregarmos sobre Nelson, teceremos loas a quem? Excetuando as divindades e os semi-deuses – antes que os fundamentalistas de todas as partes me acusem de blasfêmia imperdoável –, Madiba foi das criaturas mais admiráveis a pôr os pés neste mundo. O que não simboliza dizer que o líder sul-africano fosse perfeito. Não era, ainda bem, pois as perfeições podem ser entediantes e incompreensíveis.

Como se vê, os nomes eram vários: seis ao todo, sempre preservando o sobrenome Mandela. Rolihlahla, em Xhosa (tribo à que pertencia, por causa do pai, quando nasceu), significa aquele que traz problemas. Nelson foi o nome que ganhou na escola, devido à influência inglesa no país. Madiba, nome do clã pertencente ao povo Thembu do qual passou a fazer parte. Tata, em Xhosa, significa pai. Khulu, em Xhosa, tem sentido de avô, sendo também sinônimo de grande e supremo. Dalibhunga, nome que recebeu da etnia Xhosa aos 16 anos, cujo significado profético é criador da conciliação, do diálogo.


Mandela, homem de coração largo e generoso, é daqueles que não deveriam morrer. É impressionante notar que o sul-africano viveu seus 95 anos de tal forma, que se a minha vida e a sua, caro leitor, fossem somadas, ficaríamos aquém, ainda que vivêssemos praticamente um século ou mais. Nós, os medíocres, deveríamos só olhar, porque Mandela inspira. Diferente do resto, eis o homem que tinha o sorriso, o olhar e a palavra e, por isso, não era um qualquer.

É senso comum dizer que o mundo seria bem melhor se mais Mandelas aparecessem. Mas ele só foi quem foi por ser um. E a ideia da raridade é justamente essa: fazer com que a figura fique para a posteridade por ser única, a referência, e não o banal. É como se Deus tivesse botado uma porção a mais de si em Mandela para que o mundo pudesse deliciar. Mas nada disso bastaria, se o revolucionário não tivesse o talento humano de potencializar o dom.


A filosofia platônica prega que a morte é a cura. É o momento em que a alma, infinita e perfeita, desprende-se do corpo, perecível e falho. Para Platão, a viver terrenamente é inviável, pois como pode ser boa uma vida que se desenrola com base no aprisionamento? Ao que parece, Mandela desmentiu um dos gigantes do pensamento grego. Mostrou que o corpo pode complementar a alma e consumar o impossível. Um beijo, Dalibhunga.